Capítulo 1

Rico Bauer

Odeio a minha cidade, ao mesmo tempo em que a amo.

São Luís não é o que podemos chamar de grande, mas também não é minúscula. Sendo muito honesto, a única coisa realmente grande aqui é o ego de alguns moradores. Por isso o meu espanto ao ver a boate transbordando de gente. A Terceiro Tempo é famosa, mas estar dessa forma chega a ser um fato curioso.

Claro, isso se eu não soubesse de quem é a festa.

É aniversário da filha do prefeito. A guria saiu convidando todo mundo das redondezas, apenas pelo fato de saber que ninguém recusaria. O Frade, por exemplo, foi convidado em peso.

Sei que não deveria estar aqui, mas ficar em casa me deixaria ainda pior. O time todo recebeu ordens do treinador para descansar depois do dia de hoje. Não só o jogo foi pesado, mas também tivemos o funeral do avô do Muralha. Só que eu, Caruso, Mel e Arauca decidimos que valia a pena enfrentar a ira de Levi por uma noite de diversão, até mesmo para aliviar o peso do que aconteceu. Estou me sentindo mais derrotado do que de costume, porém não vou embora.

Sou uma fraude mesmo…

Só consigo pensar que, talvez, todas as acusações que meu pai faz possam ser verdadeiras.

Jogo a latinha em uma das lixeiras apenas para descobrir que meus reflexos estão ruins: ela foi parar a dois metros de distância de onde pretendi. Ainda bem que sou goleiro e não preciso de uma boa mira.

O DJ troca a música e a nova batida começa a me incomodar, como se estivesse atingindo o meu peito. Isso significa que o álcool está perdendo efeito, algo que não pode acontecer.

Não hoje.

Esta noite, preciso me entorpecer.

Com passadas incertas, sigo até o balcão do bar. Aposso-me de um dos bancos altos e apoio os cotovelos sobre a madeira escura. Apesar de a cidade ser pequena, a Terceiro Tempo é um dos pontos altos de São Luís, e todo mundo me conhece.

Como não conhecer?

Não bastasse ser goleiro reserva do Frade, bem como ter sido chamado para a Seleção Brasileira Sub-20, nasci e cresci aqui. Além disso, tem a fama do meu pai. O grande cardiologista dr. Álvaro Bauer, renomado em toda a região Sul e Sudeste, também é conselheiro do São Luís do Sul Futebol Clube.

O meu pesadelo ambulante é um tipo de herói da cidade.

— Ei, chefe! — grito, por cima do balcão. — Manda mais uma dose aqui.

Aponto para a garrafa de tequila que foi deixada em algum ponto da mesa de apoio. O rapaz responsável pelo bar me olha por cima do ombro e, erguendo a mão, pede um minuto.

Busco Caruso pelo salão e o vejo em um canto não muito distante, olhando ao redor. Certamente está buscando seu próximo alvo. Viemos juntos, como quase sempre acontece quando tem balada; porém, diferente dele, nunca termino a noite bem.

Somente mais uma das muitas merdas da minha vida.

A boate está repleta de jovens universitárias, além de mulheres bonitas e acessíveis. Pelo modo como elas me encaram, sei que hoje seria um dia perfeito para finalmente perder o meu cabaço. Em vez disso, estou aqui, irritado e só querendo encher a cara.

Bato mais uma vez o shot sobre o balcão, para chamar a atenção do barman, mas sou ignorado.

— E aí, piá? — Arauca, meu parceiro de clube desde que éramos adolescentes, se senta no banco ao meu lado. — Tá fazendo o quê?

— Esperando a boa vontade do bartender em me mandar mais uma dose — grito as últimas palavras, querendo chamar a atenção do cara do bar.

— Eita,  tá puto, hein? Por quê?

— Não está claro? — resmungo. — O filho da puta do Fragoso levou dois frangos. Dois! Bem quando estávamos ganhando de dois a zero! — Ergo os dedos, frisando a porra do número de gols que levamos. — Ele está cada dia pior, porra, e nem assim eu consigo uma chance no time titular!

Sei que não sou lá um Taffarel da vida, mesmo assim, se ficasse capenga e com dor de barriga, ainda daria mais conta do que aquele bosta. Não fosse pelo Moretti, nosso capitão, e pelo Muralha, ambos fazendo gols no fim do jogo, era bem capaz de termos nos dado mal. Pior, podíamos nem ter avançado para a próxima fase.

— O cara tá foda, mesmo. Sei lá, guri… — Dá de ombros. — O Levi está sem opções, por isso segura o máximo que pode antes de a merda estourar. Todo mundo sabe que você é melhor, mas não tem muita experiência…

Encaro o piá alto e magricelo, que se curva sobre o balcão. Assim como eu, Arauca subiu da base do Frade há alguns anos e vem esperando, pacientemente, sua chance no time titular.

— E, só por causa disso, tenho que ver aquele idiota fazendo merda atrás de merda? Pior, tenho que achar que está tudo bem?

Aponto mais uma vez para a garrafa de tequila, quando finalmente o bartender se aproxima de nós. Sem questionar, ele enche mais um shot e desliza pelo balcão até estar à minha frente. O copinho já tem sal nas bordas e, por isso, bebo o líquido de uma vez, apanhando uma fatia de limão e levando-a à boca na sequência.

O líquido desce mais amargo do que de costume. Sinto que estou começando a empapuçar. Bem como eu queria.

— Não disse que precisa ficar quieto — Arauca continua. — Você sabe que é difícil para o treinador mudar de ideia, mas você pode dar uma pressionada de fora, com os seus contatos. Por que não usa os poderes superiores para garantir um lugar no time?

Cogitar isso me deixa enjoado. Sei que não diz por mal, mesmo assim, incomoda. Já conversamos várias vezes sobre os privilégios que ele pensa que eu tenho — vidinha confortável, herdeiro de uma boa grana, um pai conselheiro do Frade… Vendo de fora, qualquer um pensaria que estou muito bem, obrigado.

— Quero garantir essa porra de titularidade por mérito — digo, apenas. Ergo o shot vazio para o bartender, que o enche de novo.

A bebida desce rasgando, como fogo na garganta. Meu fígado parece prestes a falhar e isso até poderia ser ruim, se não ajudasse a enevoar os pensamentos.

— Mas precisa ser titular? A gente ganha um salário bom, mesmo não entrando em campo. Acho que está chorando de barriga cheia, Rico. Você já foi convocado pra Seleção, tem os bolsos cheios de grana, estabilidade e pode pegar a gostosa que quiser. O que mais falta, cara?

Solto o ar pelo nariz, seguido de uma risada sem humor. A convocação para o Sub-20 foi o auge da minha carreira, mas nem assim fui titular. Fiquei o tempo todo no banco, vendo os jogos de um lugar privilegiado. Porra de vida, viu? Não vai demorar muito para o meu sobrenome mudar de Bauer para Banco.

— É, cara… Eu sou foda, mesmo — murmuro, enquanto Arauca se levanta. Uma das muitas garotas que estão aqui se aproxima, chamando sua atenção, e eu sou rapidamente esquecido.

— O que tá rolando? — Caruso, nosso parceiro de clube que também divide o apartamento comigo, ocupa o banco vazio do outro lado. — Riquinho tá puto de novo?

— Você também? Não vem com essa, tá?

— Olha só, filho da puta — acompanho o shot de bebida ser retirado de minha mão em um gesto brusco —, já falei que entendo essa sua chateação, mas o que você vai fazer a respeito? Ficar sentado aqui, no bar, enchendo o cu de cachaça? É essa a grande redenção da promessa do Frade, Rico Bauer?

Encaro-o, sentindo o estômago queimar. Não acho que seja uma boa ideia ele sentar aqui do lado e vir me falar merda, não com o ânimo que estou hoje.

— Vá se foder…

— Bauer, eu sou carioca — explica, me deixando confuso. Pela expressão que traz na cara de pau, essa merda deve fazer sentido na cabeça dele. — Sabe por que carioca é marrento? Porque precisamos competir por espaço com seis milhões de pessoas. Aqui, nesta cidade mixuruca de cinquenta mil pessoas, só é bundão quem quer.

Preparo-me para levantar, pois não estou a fim de perder um amigo, mas sou impedido quando ele segura o meu braço.

— Senta ai e me deixa terminar — ordena. — Você tem razão em estar chateado, moleque, mas não adianta ficar sentindo pena de si mesmo. Você acha que eu sempre fui titular em todos os times que passei?

Busco em minha cabeça enevoada por lembranças de alguma conversa que tivemos sobre esse assunto, mas não encontro nada. Desta forma, apenas dou de ombros, incerto sobre o que responder.

— Eu tive a chance de jogar na primeira divisão, moleque. De estar em um time grande do Rio de Janeiro, mas não me quiseram. Eu recebia todos os elogios nos treinos, só que na hora do vamos ver… — Caruso sorri, mas é nítido que essa época não está entre suas melhores recordações.

É um choque de realidade. Estou puto por não ter a minha chance, por Fragoso ser um mão de alface do caralho, por achar que estou me esforçando demais para nada… E agora Caruso esfrega na minha cara que não sou exceção.

— Sinto muito.

— Eu não. — O grandalhão se esparrama no banco, sua atenção dividida entre a conversa que estamos tendo e algum ponto atrás de nós. — Isso me ensinou a ter marra, moleque. Não deixo ninguém saber o que me afeta, sabe?

— Lá vem você de novo com essa porra de marra — reclamo. Já tem meses que estamos dividindo o apartamento e, desde sempre, ele vem com essa ladainha.

Saltando do banco, ele para ao meu lado apenas para me dar dois tapinhas no ombro.

— Não vou ficar repetindo reza pra santo surdo, moleque. Esta será a última vez, mas só porque é meu amigo: você é bom, então assuma isso. Seja marrento, caralho! Está grande demais pra ficar choramingando.

Caruso não me dá chance de retrucar e sai. Apanho a garrafa de tequila e derrubo mais uma dose, sorvendo o líquido de uma só vez. Ele desce queimando e deixa tudo o que ouvi pulsando dentro de mim. Queria que tudo fosse fácil como ele sugere.

 Seja marrento — imito o seu tom de voz, virando mais uma dose de tequila. — Como se fosse fácil.

— Acho que sei o que falta. — Arauca, que eu sequer tinha visto retornar, empurra meu ombro. — Afinal, você pode pegar quase todas as gostosas. — Sem entender, encaro-o com uma sobrancelha erguida. Estou bêbado, mas é ele que não fala nada coerente. Até que meu amigo aponta para algum lugar no meio do salão.

Estico o pescoço, curioso. Assim que noto sobre o que Arauca estava falando, chego a sentir uma pontada no peito. Só pode ser mentira a visão da mulher mais gostosa que já vi por essas redondezas — ou qualquer outra redondeza, se vale a nota.

Ela dança sozinha no meio da pista. O cabelo escuro desce solto até o meio das costas e a blusa justa marca um par de seios que fazem minha boca salivar. A saia não ajuda, deixando pouco para a imaginação: o tecido colado permite que se tenha a real noção da bunda deliciosa, que rebola acompanhando a batida, seguida por um par de pernas que faria qualquer homem feliz se estivesse enganchado em torno da cintura dele.

— Porra… — murmuro quando vejo-a levar a garrafa de cerveja à boca. A visão dos lábios grossos em torno do gargalo da long neck ativa minha imaginação.

Preciso daquela boca em outra coisa bem longa e larga.

Dou risada com o pensamento estranho. Deve ser culpa da bebida, afinal, posso enganar aqueles que acreditam que sou um comedor de primeira, só que não dá para enganar a mim mesmo.

Rico Bauer continua sendo o mesmo piá virgem de sempre.

— Duvido que você consiga pegar essa daí — Arauca murmura ao meu lado, lembrando-me do que estávamos conversando. O infeliz parece aqueles diabinhos que se sentam em nosso ombro, sempre incentivando a fazer merda.

— Hoje não. Estou de boa.

— Ah, qual é, Riquinho? — ele brinca, usando o apelido que odeio. — Aposto que não consegue ficar com ela. É muita areia até para o seu caminhãozinho.

“Também acho”, penso, porém não digo isso em voz alta. Em vez de verbalizar minha insegurança, aproveito o gás que a tequila me deu e visto a máscara de Rico pegador. Respiro fundo e jogo os ombros para trás, mas, quando dou o primeiro passo, sinto a cabeça leve. Merda, bebi para um caralho hoje — depois de meses só no suco e na água. Mesmo assim, bato a mão no ombro do Arauca e sigo, em linha quase reta, na direção do pecado.

De costas para mim, o ar some dos meus pulmões no instante que ela coloca uma das mãos no joelho e curva o corpo para a frente, balançando o quadril de um lado para o outro.

Puta. Que. Pariu.

Assim que paro perto dela, é como se a mulher sentisse a minha presença, pois logo ergue as costas e vira de frente para mim, ao mesmo tempo que cruzo os braços. Com uma lentidão fodida, a guria ergue os olhos até os meus. São grandes, expressivos e parecem surpresos. Como se não entendesse a situação, ela levanta uma sobrancelha à espera do meu movimento. É curioso não receber um sorriso, como todas as outras mulheres fazem quando se veem abordadas por mim.

Não vou ser hipócrita, sei que muitas são apenas marias-chuteiras interessadas no status de sair com um jogador de futebol. Todas sempre com altas expectativas, que, com certeza, eu frustraria. Hoje, no entanto, isso parece esquecido em um canto da minha cabeça, enevoado pelo tanto de álcool que consumi.

— Perdido aqui, novinho? — a mulher me cumprimenta.

— Naaah… Acabei de me achar — respondo e dou mais um passo adiante.

Sentindo a coragem líquida falar mais alto — ainda que tenha certeza de que ela me mandará pastar logo, logo —, coloco as mãos em sua cintura fina.

— Ô meu pai, acho que vou me dar bem no meu primeiro dia na cidade — ela diz para ninguém em específico, ajeitando o corpo na minha pegada.

— Primeiro dia?

— Hu-hum. Cheguei hoje e não deveria ter vindo para cá. A decisão mais segura era ter ficado em casa, desfazendo mala. Só que como recusar um convite tão tentador? Minha amiga me convenceu de que o errado é certo esta noite. — Pelo papo, acho que a guria também já bebeu um pouco. Aproximando-se de mim, ela passa o braço pelo meu ombro e aponta para o outro lado do salão. Quando viro a cabeça, percebo que o alvo é Caruso, agarrado com uma loira que lembro já ter visto em algum lugar. — A safada disse que precisava da minha companhia, mas achou aquele carinha. A péssima amiga me abandonou para se atracar com ele. Só me restou ficar aqui e dançar.

É engraçado ela chamar o lateral pegador e meu amigo de “aquele carinha”. Da mesma forma que é hilário ela não chamar meu nome de um jeito afetado, como todas as gurias costumam fazer quando me encontram.

Nessa hora, o DJ decide trocar o funk por uma música sertaneja mais animadinha. É o tipo de som perfeito para dançar a dois, por isso, aproveito a súbita valentia e a puxo pela mão. Com um impulso, grudo seu corpo ao meu. Surpresa, a guria solta um gritinho, mas não se opõe à aproximação.

— Você não sabe quem ele é? — questiono, interessado no fato. A guria franze a sobrancelha, balançando a cabeça em negativa.

— Eu deveria? É famoso na região?

Subitamente, sinto-me mais leve. Também nunca peguei mulher enquanto estava bêbado, mas deveria ter pensado nisso antes, porque hoje estou sem aquela trava que sempre me leva a ficar falando um caminhão de bosta em vez de agir. Com essa, vai ser muita ação e pouca falação.

— Acho que gosto do fato de você não saber quem ele é.

— Hmmm, um homem territorialista — ela cantarola.

Enlaço sua cintura com o braço direito e deito a cabeça em seu pescoço, inspirando o perfume dali.

— Nem sabe o quanto — sussurro contra sua pele.

Cheirosa para um caralho.

Deslizo a mão por sua lombar, até parar sobre uma das nádegas, onde aperto de leve. O ritmo da música faz seu corpo esfregar no meu conforme dançamos, aumentando a temperatura.

— Sua mão é grande, guri — ela diz num tom elogioso. Devo estar bêbado mesmo, pois nem o fato de me chamar de “guri” me incomoda.

— É apenas uma das várias coisas grandes que eu tenho. — Resvalo meus lábios propositalmente na pele de sua orelha.

— Ô inferno… — ela murmura. — Qual o seu nome?

— Você não sabe mesmo? — Afasto meu corpo o bastante para a encarar. Não ser reconhecido deveria ferrar ainda mais a minha já prejudicada autoestima, no entanto, fico empolgado.

Sem nomes, sem expectativas. Sem pressão.

— O quanto você bebeu? — a guria pergunta ao me ver tropeçar nos passos.

— O bastante para fazer merda — confesso.

Ela ri, jogando a cabeça para trás. O som me faz esfregar o quadril nela com mais vontade.

— Está muito animadinho, guri. Fica sempre assim quando chega perto de uma mulher?

— Não, pelo contrário. — A frase sai meio sem controle. — Normalmente, sou bem controlado. Mas não sei o que você tem que me deixa sem travas. Deve ser essa boca gostosa, ou a bunda que parecia me convidar para encher as mãos nela.

Dentes muito brancos beliscam o lábio inferior carnudo, enquanto ela me analisa por um segundo que mais parece uma eternidade.

— Huum… Declaração perigosa. Vou dar um desconto pelo fator etílico, novinho.

O rosto dessa mulher é ainda mais impressionante de perto. O nariz pequeno e arrebitado, a boca grande e carnuda, os olhos amendoados. Ela tem aquelas sobrancelhas arqueadas, típicas de quem é irreverente. Sem falar do atrevimento que salta da pele macia dourada pelo sol e do corpo cheio de curvas. Meus olhos ficam presos na boca farta, principalmente quando a pontinha da língua passa, rapidamente, umedecendo o lábio inferior.

No exato lugar que estou maluco para sentir o sabor.

— Você é linda, sabia? — O elogio sai de forma inesperada. — Linda e gostosa demais. Fico fora do meu normal.

Balanço a cabeça, sabendo que já estou falando demais. Porém é a pura verdade. Tenho o costume de começar uma conversa, ficar tentado a saber da vida das gurias antes de ir para o beijo. Sempre achei que teria mais chances bancando o simpático e tentando agradar. Só que, muito provavelmente, esse é o exato motivo de as mulheres ficarem entediadas — e acabo ficando no cinco a um toda vez. Cansei dessa merda. Pela primeira vez, atravessei o salão disposto a ficar com uma mulher sem trocar muitas palavras.

A guria me olha com surpresa, talvez achando que estou maluco. Tenso, aguardo o momento que ela vai cair em si e me empurrar. Mas quando se passa um minuto e ela não faz nada, seguro sua nuca com firmeza, enroscando minha mão em seu cabelo. Não há delicadeza em meu toque.

Puxo o rosto dela para cima e tomo sua boca. Por um instante, seu corpo fica tenso, o que me fez esperar um empurrão e talvez um tapa na cara pela audácia. Mas tudo dura só um mísero segundo antes de ela ceder. Então, entreabre os lábios dando-me espaço e…

Porra!

Beijar sempre foi o meu forte, afinal, era o disfarce perfeito para compor a fachada de garanhão que tenho construído nos últimos anos. Porém os lábios dessa mulher me deixam tonto.

Claro, pode ser a tequila também, mas o mundo ao redor parece deixar de existir quando nossas línguas se encostam.

Meu coração bate furioso no peito. Sinto meu pau ficar duro e dolorido. A pele esquenta, alastrando um fogo que percorre todo o meu corpo, consumindo tudo pelo caminho.

Apoio a outra mão na lateral do pescoço dela, mantendo a cabeça firme. Quero devorá-la por inteiro, provar tudo o que estiver no caminho. Nossas línguas se enrolam, duelam e exigem ainda mais do que estamos dando.

Essa mulher tem a boca muito doce; um misto de cerveja, menta e alguma outra coisa que quero repetir. Sem falar no jeito perfeito que se encaixa na minha. A cada roçar de lábios e toques de línguas, o beijo exige mais.

Sinto a mão pequena se apoiar em minha nuca, os dedos resvalando nos fios curtos do cabelo. Quando a puxo mais para perto, sinto os bicos endurecidos dos seios pressionando contra meu tórax.

Puta que pariu! Ela está sem sutiã.

Porra, nunca pensei que… porra. Vou explodir aqui, exatamente como um virgem sem experiência.

Preciso transar com urgência.

Precisa ser com ela.

Precisa ser hoje.

Agora!

Mesmo sem ar, ainda me recuso a quebrar o beijo. Não consigo desgrudar a boca. Envolvo a cintura fina com meu braço, quase a erguendo no colo. Ouço o gemido abafado em minha boca, e o som me deixa ainda mais duro, mais afoito.

Já estava pensando em como seria foder essa mulher quando alguém esbarra em minhas costas, me fazendo interromper o beijo febril. Puta merda! Ficamos nos atracando no meio da pista!

Ofegante e sem querer soltá-la, olho ao redor à procura de algum ponto que me permita continuar o que estávamos fazendo. Uma ideia meio torta passa pela minha cabeça.

— Vem comigo — ordeno, puxando-a pela mão para fora da pista.

— Espera, aonde vamos? Não posso deixar minha amiga… — ela argumenta. Com um gesto de cabeça, aponto para o corredor à frente, sentindo-a se acalmar e me seguir.

Talvez amanhã eu me arrependa desse comportamento tão inconsequente, mas hoje quero aproveitar. Ela também não parece preocupada, e essa aceitação apenas me estimula a fazer o que pensei. Conforme nos embrenhamos pelo corredor, ouço os saltos dela batendo no chão atrás de mim, aumentando minha expectativa.

A ideia é ir ao banheiro feminino, porém, assim que chegamos, a fila imensa acaba me desmotivando. Ao virar a cabeça na urgência de achar um novo lugar, vejo Mel, um dos zagueiros do Frade, saindo do banheiro masculino no extremo oposto de onde estamos. Ao perceber que estou acompanhado, ele entende a intenção e solta um sorriso maroto, como bom mulherengo que é.

Merda. Vai ter que ser ali mesmo.

— Tem gente aí dentro? — pergunto para o meu colega de time, sem pensar muito.

— Se tem, vai sair rápido. Eita orgulho desse mascote, viu? — Mel zomba e abre a porta, engrossando a voz: — Vamos sair, piazada, que o banheiro vai ser interditado.

Dois caras passam por nós, me olhando e rindo. Não sei quem são e pouco me importa. Nem mesmo Mel ganha a minha atenção. Não tenho ideia de como tenho cara de pau de passar por ele com a cabeça erguida, ainda mais quando o zagueiro é o que mais apoia esse meu lado mulherengo.

Foda-se. Não vou pensar nisso agora. Entro no banheiro, agora vazio, e tranco a porta. Quando me viro, uma visão do pecado me aguarda.

— Dar uns pegas no banheiro masculino é novidade para mim — ela brinca, mas não respondo. Não consigo dizer nada, temendo que, se abrir a boca, vou acordar desse sonho maravilhoso na minha cama, sozinho e com o pau duro na mão, batendo uma punheta, como sempre.

Dou uma olhada rápida ao redor, procurando a superfície mais limpa onde posso prensá-la. Sem me preocupar com avisos, empurro a guria contra a parede ao lado da porta, colando meu corpo ao dela.

Minha cabeça está funcionando a 300km/h, impulsionada pelo pulsar dolorido do meu pau dentro da calça. Pode ser também pela respiração pesada dela, os seios subindo e descendo, esfregando no meu peito. Ou os olhos meio fechados, fixos em minha boca.

Dou alguns segundos para que ela decida se afastar, me empurrar, destrancar a porta e me rejeitar. Quando isso não acontece, respiro fundo, tentando me acalmar para o que vem a seguir. Só que a tranquilidade evapora assim que sinto a mão pequena subindo por minha cintura, a unha resvalando no tecido da camiseta, bem no meio da minha barriga. Fico todo arrepiado.

Seguro uma mecha do seu cabelo, sorrindo de forma predatória. Com a outra mão apoiada na cintura fina, enfio a perna entre as dela, sentindo como está quente.

É então que desço a boca, primeiro mordiscando o lábio inferior, segurando-o entre os dentes enquanto mantenho os olhos abertos e fixos nas reações desta mulher. Mexo o corpo para cima e para baixo, o suficiente para a coxa roçar no ápice entre as pernas femininas. Um gemido baixinho escapa de entre os lábios carnudos, os olhos semicerrados, a respiração ofegante. Tudo nela é lindo e desperta em mim uma fome, como nunca senti antes.

Não espero muito até beijá-la novamente. O calor entre nossas bocas queima, enquanto nossas línguas duelam. Não quero soltá-la nunca mais.

Corro a mão livre pela lateral do seu corpo, mapeando a curva do quadril, a cintura, as costelas. Subo um pouco, dedilhando até encontrar a lateral do seio. Minha palma parece queimar com a vontade de tocá-lo.

É uma loucura, eu sei, mas não tenho tempo de analisar o que estou fazendo.

Só sinto desejo e pressa. Um tesão maluco, amplificado pelo cheiro dela, pela maciez da sua pele, por cada vez que a vejo se arrepiar.

Pego-a no colo e enlaço suas pernas ao redor da cintura, pressionando-a contra a parede, esfregando meu pau que quer sair de dentro da calça. A saia curta sobe, ficando embolada na cintura.

Sem quebrar o beijo, movo o corpo dela para cima e para baixo, tentando aliviar a dor do meu pau contra o tecido fino. A guria solta um gemido longo e arfante.

É loucura demais.

Precisando respirar, solto os lábios sem me afastar, deslizando a boca pelo queixo delicado, seguindo para o pescoço macio e cheiroso. Ela está tão quente, tão receptiva, que só me dá a certeza de que é hoje que eu finalmente perco essa maldita virgindade.

Se eu estou afoito, ela não fica para trás. As mãos pequenas parecem estar por todo canto, percorrendo meus braços, pescoço, puxando meu cabelo. Ela ergue minha camiseta, deslizando as unhas por baixo dela, arranhando minhas costas.

Seu toque parece queimar a minha pele.

Tudo parece uma brasa enlouquecedora, como se eu estivesse pegando fogo.

Fora de mim, mordisco a pele do ombro dela, uma das mãos encaixada em sua bunda, enquanto a outra desliza por seu corpo até espalmar a cintura fina. Com o nariz, faço a alça da blusa escorregar pelo braço, afastando-a até passar do ombro.

Bastaria apenas um puxão para deixá-la nua da cintura para cima.

Pensar nisso me causa um arrepio, que sobe pela espinha e deixa até os pelos da minha nuca em pé. Quase consigo ouvir o coração batendo desgovernado em meu ouvido. De repente, percebo que estou tão ansioso que, provavelmente, vou gozar em dois minutos.

Porque é isso o que vai acontecer.

Não vai dar tempo nem para dar prazer a ela. Se deixar isso acontecer, amanhã estará na primeira página dos jornais: “Goleiro reserva do Frade não segura a onda, esporra nas calças em menos de trinta segundos e passa vergonha.”

O que estou fazendo?

Talvez eu não esteja tão bêbado como imaginei, já que estou tendo lampejos de razão. Mas que porra! Por que infernos eu não bebi mais?

Uma batida forte na porta faz com que nós dois demos um pulinho, abrindo os olhos e voltando à realidade. Não que eu consiga parar de me esfregar entre as pernas dela, mas isso é um detalhe. Por que alguém precisava cortar o clima bem na hora que eu estava começando a ter dúvidas?

Interpreto a interrupção como um aviso do destino. Um bem filho da puta.

— Acho que tem gente querendo entrar — ela sussurra, passando a mão no meu cabelo num carinho gostoso. Recosto a testa na curva do seu pescoço, apenas me deliciando com o perfume feminino.

Merda, merda, merda!

— Acho melhor sairmos e deixar isso para outra hora — digo, me afastando o suficiente para olhar em seus olhos.

Acho que não era a resposta que ela esperava ouvir, já que um toque de decepção brilha em seu olhar. Quase admito que também não queria parar, ou que podemos continuar em algum lugar mais tranquilo. Mas é loucura.

Coloco-a no chão, me recriminando por tudo. De costas e envergonhada, imagino, ela ajeita a saia, puxando o tecido para baixo. Em seguida, arruma a blusa.

Sei que ando desesperado para transar, mas não ao ponto de perder minha virgindade no banheiro de uma boate, bêbado feito um gambá. Agora que a lucidez está mais afiada, tenho certeza de que corria o risco de ter a minha pior performance. Merda. Eu faço tudo errado mesmo.

Ajeito a camisa, tentando disfarçar o volume na calça, e suspiro. Como posso recuperar o clima que ferrei? Um pouco inseguro se vou ser rejeitado ou não, seguro sua mão assim que ela está pronta para aparecer em público novamente. Mesmo que a situação seja constrangedora — tanto que evito até mesmo olhar para ela —, não quero parecer um babaca. Porém, quando ela me olha de canto, percebo o inevitável: ela vai pensar que sou um canalha.

Inevitável mesmo.

Ela pode me xingar do que quiser, ainda assim, não vou deixar que saia do banheiro sozinha. Logo que abro a porta, damos de cara com um dos seguranças da boate pronto para passar o maior sermão no engraçadinho que se trancou ali. Porém, como ele me reconhece de imediato, não diz nada, apenas balança a cabeça em reprimenda.

Sem ter o que dizer, já que também estou me xingando, faço o caminho de volta para a pista de mãos dadas com a guria linda. A cada passo, fico pensando no que dizer. Peço desculpas? Dou meu telefone para ela? Ou seria melhor pedir o dela e remarcar?

Quando chegamos na aglomeração de pessoas dançando, a guria solta minha mão e se afasta sem mais uma palavra. Merda, perdi a chance de dizer algo. De saber seu nome. De me desculpar.

Em vez disso, irritado, sigo para o bar. Preciso de outra bebida. Pelo menos de uma dúzia. Ficar bêbado de verdade é a melhor solução para este momento. 

Agarrado nos pênalties

Lucy Foster

259 Páginas

Rico Bauer está cansado de quase chegar lá… até que recebe uma ajudinha do destino e o jogo vira a seu favor.

Com a nova fase da Copa Sul, ele quer muito uma chance para mostrar do que é capaz. Mas ficar com o foco dividido entre cuidar do seu irmão caçula e se tornar o goleiro titular é uma missão complicada. Para piorar, desde que entrou para a equipe principal do São Luís Futebol Clube, Rico é obrigado a sustentar uma mentira: de ser um pegador, em vez de um tremendo virgem de vinte e dois anos. Só que o encontro explosivo com aquela mulher inesquecível quase mudou tudo. Quase.

Beatriz Martins chega a São Luís determinada a detestar tudo e todos, principalmente seu novo emprego como assessora de imprensa do Frade. Afinal de contas, ela odeia futebol — em especial o ego dos jogadores. Por isso, descobrir que o novinho gostoso da boate faz parte do time a deixa em choque. Mesmo que Bia se esforce para fugir da tentação, Rico está em todos os lugares. Lindo, loiro, sarado e olhando para ela como se quisesse devorá-la. Como se isso não fosse o bastante, agora ela só consegue pensar em uma coisa: sentar naquele banco.

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